sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Interioranas

As primas engordaram. Mas tinham casa, marido e filhos.
Nada era lá grandes coisas, mas coisas grandes o bastante para lhes preencher a vida.
A casa não precisava ser tão boa, afinal; bastava ser própria.
Nem o marido precisava ser o melhor; são todos iguais, já dizia a tia solteirona, só muda o endereço. E, além do mais, galã só existe na novela das oito. Melhor se conformar com a careca, o ronco desgraçado e a barriga de cerveja.
Já os filhos, ah, esses eram os mais espertos e bonitos do mundo. Pois eram seus.
E assim a vida corria. A segunda não tinha cara de segunda. Quem sabe parecida com um domingo à tarde? Mas, então, qual a graça de esperar pelo domingo à tarde?
As contas eram pagas da mesma forma; dava-se um jeito, Deus ajuda.
As viagens eram boas; no máximo, para levar as crianças ao zoológico na capital. Ou uma praia nas férias, se desse, no Espírito Santo. Pra que ir mais longe? Bobagem.
E os sonhos? Ah, pare com isso. Sonho é pra quem não tem o que fazer. Melhor se preocupar com as roupas pra passar.
Ops, a campainha tocou. Era a vizinha (que também engordou um pouco).

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Mudança ou arranjo

O que era quarto virou sala
O que era sala, cozinha
O que era cozinha, banheiro
O que era bonito
Agora é feio.
Importa é que tudo se arranja
E a gente vira outra pessoa
A cada mudança.
Importa é que ainda há outra chance
E que se a gente muda
É porque acredita.

Um tango (arquivo de viagem a Buenos Aires)


Olhos se encontram
A dança começou
Vamos juntos, mãos dadas
A vida nos convida para um tango
E agora somos música

Passos rápidos
Sincronizados, certeiros
Temos pressa em ser feliz
A vida não nos dará
De novo outro tango

Vamos juntos
Melancolia, paixão
E o medo de errar os passos
Mas nada pode ser mais bonito
Que nós dois pelo salão

Nós duas

Você é água
Eu, vinho.
Você é dia
Eu, lua.
Você é minha
Eu, sua.
Cadê aquela doçura?
Pra que ser tão dura?
Querida, preste atenção
A vida é só uma.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Verdade

Passou o vendaval.
E só sobrou a gente. Sem casa, sem roupa, sem amigos.
Até o cachorro se foi.
Restou apenas a verdade de nós mesmos.
O que temos de bom. De pior.
E a saudade. Do sonho que acabou.
Não queria acordar.
Onde estão todos agora? A cerveja? A música? O riso?
Cada um juntou sua trouxa e foi embora.
Fugiram do vendaval.
Só restou a gente. E a verdade nua de cada um de nós.
Onde está você?
E com que verdade anda agora?
Procuro, mas a minha foge em cada esquina. Parece louca.
Sei que vamos encontrá-la. A minha. A sua.
E recuperar tudo que se perdeu.
Depois do vendaval.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Parte de mim

Não sabia se devia ir. Ou ficar. Fui e voltei.
Não fui inteira. Deixei parte com você.
Mas a outra metade não voltou. Se perdeu. Quase morreu.
Voltei em parte, lado avesso.
E o coração que não veio junto vagou por aí. Suspirou.
Agora as duas partes estão perdidas.
Em algum lugar podem se encontrar. E ser só uma.
Resta saber onde. E o que foi feito do amor. Que quase morreu.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

E se

E se a raiva não fosse gesto?
E se, naquele minuto, tivesse afeto?
Teria sido diferente?
E se não houvesse dor, nem medo, nem a certeza da morte?
E se a noite não assombrasse?
E se não houvesse mais segunda, quem sabe duas terças?
Não teria carnaval?
E se não tivesse se?

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Será?

A felicidade é uma busca individual.
Mas dizem que só é plena se for compartilhada.
Será? Tudo indica que sim.